Carta a quem porventura está sofrendo do mal do século - Parte II

in #pt6 years ago

Esta carta eu escrevi especificamente a uma pessoa que amo muito e que está passando por um momento muito difícil. Foi a forma que eu encontrei de dizer a ela o quanto a estimo e incentivá-la a continuar seguindo firme, apesar do pesares e das desventuras que se acumularam neste momento da sua vida. No último post eu falei sobre esse processo tão difícil que todós nós passamos ou passaremos algumas vezes na vida, de desabamento das nossas estruturas internas (que muitas vezes é diagnosticado como um transtorno de humor, como depressão e/ou ansiedade). Comparei este processo a uma longa e solitária jornada num deserto, na qual nos encontraremos com nossos maiores medos e fantasmas, e simplesmente não haverá para onde fugir. É apenas você por você, vagando a esmo após o desmoronar do seu mundo.

Eu sei que quando estamos em processo no meio desta longa empreitada realmente fica difícil acreditar que existe mesmo um fim para essa estrada, principalmente quando já estamos caminhando nela há meses e até anos. Sei que é difícil acreditar, mas ela acaba e não é no último dia da sua vida. Testemunhei o deflagrar de muitas fugas e empreendi as minhas próprias também, de forma que trago aqui algumas dicas que podem ser úteis a outros caminhantes:

  • Tenha em mente que é perfeitamente possível entrar e sair deste processo, e o quanto antes você entender e aceitar que a pessoa que entra nesse deserto não é a mesma que sai, mais rápida será a sua travessia. Não tente manter suas velhas estruturas, sustentações e padrões. Nada disso vai ter servir mais.

  • Assuma para si mesmo que está perdido no meio do deserto: pare, chore, se desespere, descanse e depois comece a pensar em uma estratégia que seja diferente de tudo que você tentou até ali. Mesmo que isso te deixe sorumbático por alguns meses. Essa é uma das dicas mais importantes de todas. Ou você corre seriamente o risco de seguir andando, fingindo que sabe para onde está indo, quando na verdade está andando em círculos. E em um ano ou menos você terá voltado ao mesmo lugar, só que muito mais fraco, abatido e confuso.

  • Se sentir que em algum momento você precisa da ajuda dos universitários não hesite em pedir. Terapia e remédios podem ligar uma espécie de turbo naqueles que estão devagar quase parando. Às vezes essas ajudas pontuais servem como aquele empurrãozinho que faltava no final, para conseguirmos cruzar a linha de chegada.

  • Quanto estamos em processo o tempo passa mais devagar que o comum e realmente não há nada que possamos fazer a respeito disto. É como se fosse um mecanismo para nos obrigar a sentir e encarar lentamente cada dor, cada mágoa e cada lágrima que insistimos em ignorar até ali. Quanto mais conteúdo reprimido e ignorado você tiver guardado, mais lento o tempo passa mesmo, não se desespere. É parte da necessária revisão. Vai na força e na fé, persista. Demora e incomoda mas passa.

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  • Curta o seu processo. Sim, estar em processo é doído, sofrido e muito desesperador, eu sei. A maior parte do tempo a gente só quer mesmo sair dali, sumir, desaparecer, fugir, morrer. Mas se você prestar atenção verá que existem também paisagens lindas, sentimentos profundos e relances de sonhos há muito tempo esquecidos. Tem sorriso reprimido, alegrias inconfessas e desejos desconhecidos. E é uma delícia nos depararmos com esse tesouro interior. Coisas boas sobre nós mesmos que só temos a oportunidade de descobrir quando estamos em processo. E se você prestar mais atenção ainda, depois do choro convulsivo vem sempre um silêncio misturado com vazio e solidão - que nas primeiras vezes incomoda muito - mas que depois nos traz uma paz e uma leveza nunca antes sentidas. É a brisa sutil dos novos tempos que se aproximam. São pequenas rajadas dos novos ares que insistem em chegar quando tivermos atravessado nosso inferno pessoal, nosso longo deserto de desilusões.

  • Bem-vindo então ao seu novo processo. Não sei se você sabia mas esse spoiler eu acho importante contar: a vida é um looping infinito de processos internos. Uns doem mais que os outros, uns duram mais que os outros e cada pessoa tem facilidade ou dificuldade com um tipo de processo, de acordo com sua própria individualidade (portanto nunca se compare). E quanto mais você ignorar e postergar este fato, maior o tamanho do deserto que você terá de cruzar depois. Boa sorte a todos nós!

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