O Portugal de um português em Hamburgo

in #pt6 years ago

PORTUGAL

No contexto de concurso do steemit escrevi um texto sobre o que é Portugal para mim.
Vejam o link que partilhei anteriormente para poderem ler outros textos de outros steemers, sobre Portugal.

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Vou-me arriscar, vou falar (sem a respetiva autorização) em nome dos cerca de 31 milhões de portugueses da diáspora portuguesa, que como eu vivem no estrangeiro.
Nas nossas vidas Portugal é um país que existe por via da contradição.

Logo para começar é uma contradição, porque um país é em grande parte a sua gente, e assim, de certo modo a maioria deste país (três quartos) existe fora dele. E como é existir fora de si próprio?
É existir em contradição.

Significa que Portugal para um emigrante como eu, a viver em Hamburgo, é parcialmente uma ideia, uma memória que nunca pode corresponder totalmente ao Portugal actual.
Significa também que apesar de conhecermos menos da realidade portuguesa do que quem vive em Portugal, nós estamos muito mais cientes da ideia de haver esse sítio e das suas particularidades mais profundas. Nós temos a distância tanto para esquecer as facetas de Portugal que nos levaram a partir, como para sonhar com um Portugal que é uma ilusão romântica e desatualizada. Mas também significa que, através do contraste com os sítios onde vivemos, sabemos melhor que ninguém o que Portugal é e o que não é.
Acima de tudo diria que somos a língua portuguesa, por mais enferrujada que se torne no dia a dia. Uma língua riquíssima que diferencia o "ser" do "estar" o "ontem fiz" do "antigamente fazia", nos deixa aconchegadinhos quando usamos os diminutivos e é capaz de tornar uma coisa lindíssima quando usamos os superlativos. É ela a herança do que foi, mas também a ponte para o futuro, quando voltarmos a pisar o solo da nação.
No meu caso particular, essa língua vai além da identidade e da nostalgia. É a minha vida, porque eu ensino português como língua estrangeira. O que significa que mesmo que Portugal seja distante, eu tento espremê-lo até à última gota para o dar aos meus alunos, para lhes transmitir a sua essência. Na esperança de que consigam um dia sentir o que sinto quando falo português, tão diferente do alemão, do inglês, enfim, de todas as línguas. É isso que é Portugal para mim.
É aquilo que – não conhecendo tão bem como conhece quem lá vive – valorizo mais do que quem lá vive e é aquilo que tento oferecer aos outros. É o destino da longa aprendizagem dos meus alunos e eu sou como um exilado que já não pertence, mas que conhece a portas das traseiras por onde entrar, um exilado que constrói pontes quebradiças para esse lugar, esse sonho defeituoso, Portugal.

Portugal tem de partilhar o seu espaço em mim com a Alemanha, uma força diferente. Surge dessa convivência a contradição entre o que desejo reencontrar e os defeitos que esqueci e reaparecem nas férias; é a contradição entre a minha eficácia, a funcionalidade, o jeito direto, a capacidade de planear, a racionalidade, a energia empreendora alemãs e o temperamento, a calma, o desenrascar, o desfrutar da vida no momento, os sorrisos fáceis, as cortesias, a hospitalidade - essas qualidades que, se em Portugal são o pão nosso de cada dia, aqui se tornam especiais e claramente portuguesas.
Portugal é manter a calma quando outros perdem a paciência, é apreciar o convívio e o momento, é sentir a voz um pouco mais grave quando falo português, quando digo "beijinhos beijinhos" "um abraço" "pois pois" "logo vemos" "tá bem (desleixando o "es") "vamos andando" "não te preocupes, arranjamos uma solução".
E agora essas pontes que passo a vida a construir parecem fazer mais sentido que nunca. Portugal quebra a inércia, reinventa-se. Mostrando-se sempre fiél à tradição, torna-se porém iventivo, às mãos dos seus 10 milhões de habitantes, dos outros 30 milhões que transportam a sua essência pelo mundo fora e ainda às mãos de todos os apaixonados estrangeiros que querem fazer parte de Portugal. E é justamente nesta altura que sinto mais que nunca o que Portugal pode ser nas nossas vidas. É este entusiasmo pela mudança e é ouvir Portugal a chamar-me para participar nela.

Imagem:
http://bomdia.eu/…/alemanha-conferencia-sobre-o-ensino-da-…/

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Creio que para este texto uma palavra basta, aliás duas, uma é Portugal, a outra é Excelente!!!
Grande texto, parabéns @pulsaraberto.
(Um aparte, de onde vem o número 30 milhões? Segundo as Nações Unidas existem 2,3 milhões de portugueses a viver fora de Portugal)

Obrigado pelas simpáticas palavras e por referir esse aspeto.
Eu próprio tive de ir ver outra vez. Aliás tencionava de qualquer forma tornar a pesquisar porque é um número arrebatador.
Trata-se de um cálculo que inclui uma estimativa do número de descendentes portugueses até à terceira geração. Por um lado talvez estejamos a falar de muitas pessoas para as quais Portugal não seja uma parte da vida (o que torna o número e a afirmação no texto „enganadora“), por outro julgo que os portugueses são muito ligados às suas origens e ao seu país, pelo que faz sentido também incluir descendentes.

Aqui fica o link do artigo:
http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/emigrantes/ha-31-2-milhoes-de-portugueses-no-mundo

Ok, obrigado pela informação :)
Também concordo que talvez para muitos de 2a e 3a geração já não exista a tal ligação especial.. será difícil perceber se se sentem portugueses, um bocadinho portugueses ou "um dia gostava de conhecer a terra do meu avô ".
Abraço

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Que bom, obrigado!

Este texto é simplesmente arrasador! Obrigada, mais uma vez. Saudações

Um grande obrigado de volta osazuisdela!

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