Filme: Edge of Tomorrow (2014) De: Doug Liman

Se pudéssemos obter uma média do comportamento humano, um único ser extraído de todas as interações e rotinas mundanas inerentes à raça humana, o resultado seria possivelmente uma aproximação ao operário comum. Uma pessoa que, sujeita a variações de espetro microeconómico, acorda, vai trabalhar, volta para casa, faz algumas tarefas do dia-a-dia, vê televisão e vai dormir. No dia seguinte, repete. Tal como nesta simulação hipotética, ‘Edge of Tomorrow’, realizado por Doug Liman, deambula por essa visão repetitiva da vivência da pessoa normal. Porém, a sua aproximação parabólica a esta realidade dá-se através dum dos conceitos mais explorados pela ficção científica ao longo dos anos: a possibilidade de viajar no tempo. Cage, interpretado por Tom Cruise, é um funcionário do exército que, depois duma morte horrível no combate a uma raça alienígena, acorda para o mesmo cenário onde estivera horas antes, antes de ser ferido fatalmente. Então, com o intuito de descobrir uma maneira de vencer os invasores aparentemente invencíveis, este começa a levar uma vida de reciclagem constante, conforme acorda, vai trabalhar – tentar atravessar o letal campo de batalha sem ser exterminado - e morre. No dia seguinte, repete, na esperança de que a aprendizagem e superação lhe tragam um resultado mais promissor do que o da vida anterior. Além da sua interessante negação de conceitos filosóficos ou religiosos, como o fatalismo – a ideia de que o nosso futuro é inalterável, façamos nós o que fizermos –, ou a reencarnação – a ideia de que, quando morremos, reencarnamos noutro corpo -, o filme, à imagem da comédia de 1993, ‘Groundhog Day’, pode servir de metáfora para o aprisionamento que o ser humano, sujeito a superstições e à inércia, impõe a si próprio. É só devido à quebra da rotina, à obliteração dos padrões estabelecidos, ao treino e busca por conhecimento, e correspondente melhoria física e psicológica, que a personagem de Cruise consegue ultrapassar os obstáculos que lhe são impostos. Como peça destinada a um público mais amplo, está-se perante um exemplo de como o cinema de entretenimento, o blockbuster, pode abranger uma variedade enorme de conceções filosóficas, espirituais e científicas, sem que a audiência seja sobre-exposta a uma narrativa demasiado abstrata ou lenta. Para tal, Liman criou uma estrutura que permite que praticamente todas as cenas acrescentem informação à história e material para as personagens evoluírem, sempre assentes num fio condutor quer literal, quer alegórico. ‘Edge of Tomorrow’ é uma missiva descontraída para as pessoas que se afeiçoaram à costumeira diária, à opressão das forças maiores que nos obrigam a viver num ciclo de recapitulações, presos a vícios, lugares comuns e barreiras psicológicas, de onde ressalta uma mensagem auspiciosa: se deixarmos a mesmice ganhar poder sobre nós, estaremos condenados a obter sempre os mesmos resultados.