Filme: Blue Valentine (2010) De: Derek Cianfrance

_{Credit: The Weinstein Company / edited by Kubrickamente}

Ao longo dos anos, poucos filmes foram tão eficazes quanto ‘Blue Valentine’ a explorar o enorme potencial do amor para se transformar numa catástrofe. Capaz de tornar um “movie date” numa experiência excruciante, a longa-metragem de Derek Cianfrance acompanha duas fases distintas na vida de dois adultos, interpretados por Ryan Gosling e Michelle Williams, ele um “faz tudo” que abandonou a escola secundária, ela uma estudante de medicina. Qual estudo sobre a água e o azeite, a obra aborda a altura em que os dois se conhecem, apaixonam um pelo outro e, impulsionados por uma gravidez inesperada, resolvem casar, e, anos mais tarde, os dias ilustrativos dum casamento repleto de ressentimento e desilusão. Na missão de potenciar este contraste, o cinematógrafo Andrij Parekh filmou a linha temporal relativa ao princípio da relação com lentes de 50mm numa película de 16mm, uma escolha mais que adequada para evocar nostalgia, como se dum sonho indestrutível e longínquo se tratasse, e a linha temporal relativa ao casamento com lentes de longo alcance numa câmara digital, uma opção destinada a exacerbar uma visão mais pragmática dos acontecimentos, utilizando-se as ditas lentes para fazer “zooms” exagerados das personagens, isolando-a uma da outra, em discordância com o afeto e união de outrora – expectativas vs. realidade. Apesar de, ainda nos dias de hoje, o tema estar escondido numa espécie de Caixa de Pandora, nada é mais normal do que, quer seja nos nossos pais, avós, amigos ou, caso exista disponibilidade para uma auto-avaliação profunda, em nós próprios, detetarmos a deceção e toxicidade inerentes a muitas das relações amorosas que habitam o mundo moderno. Capaz de devastar o espectador com uma experiência semelhante ou o sonhador mais incauto que planeie uma imaculada vida a dois, o filme é uma força bruta no que diz respeito à descrição das metamorfoses que podem ocorrer no casamento comum. ‘Blue Valentine’ é um dos maiores antídotos inventados até hoje para o clássico romance fabricado em Hollywood que, infelizmente, salvo raras exceções, tem alimentado uma noção desfasada e idealista do que é a união amorosa e dos desafios que esperam quem se aventura por tal itinerário. Para se prepararem para o filme, a dupla de protagonistas, assim como a jovem atriz que interpreta a filha do casal, mudaram-se para uma casa, a mesma que na ficção, durante um mês, onde encarnavam as suas personagens e simulavam a respetiva rotina e orçamento. Numa das cenas, num momento de raiva, a personagem interpretada por Gosling tem de arrancar a aliança e atirá-la para longe, processo que impõe claras dificuldades ao ator. O anel, depois de tantos ensaios, estava preso ao dedo.