República de mão cheia #1 -Os símbolos nacionais- parte 2 - Hino

in #pt6 years ago (edited)

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O Hino Nacional é, tal como a bandeira, um dos símbolos da nação.

Em 1910 foi instituído com esse desígnio, o poema musicado intitulado “A Portuguesa”, que havia surgido duas décadas antes, fruto do sentimento patriótico dos insurgentes contra o ultimato inglês, para que Portugal retirasse do “Mapa cor-de-rosa” as tropas que tinha posicionadas em África.

  • O que foi o "Mapa cor-de-rosa"?

Em fins do séc XIX os vários países intensificavam o interesse por África, em virtude do crescimento da indústria na Europa (para o que necessitavam de mais matéria-prima) e da expansão económica (para o que necessitavam de alargar o mercado). Esta corrida das potências europeias às colónias africanas acabaria por causar muitos conflitos, que procuraram resolução na Conferência de Berlim, entre 1884 e 1885, em acordos de partilha de territórios.

Neste contexto, Portugal, ferozmente agarrado aos “direitos historicamente adquiridos” sobre as suas terras, procurou expandir as duas zonas do litoral africano dominadas na época (Angola e Moçambique), através da ocupação e domínio de uma faixa de território entre as duas e que ligava o Oceano Atlântico ao Índico.

Na época, o desenho deste território, efetuado pela Sociedade de Geografia de Lisboa, foi enviada ao parlamento nacional pintado em cor rosa, o que originou o nome que assim fiou historicamente perpetuado.

Desenho do mapa cor-de-rosa (Fonte > https://goo.gl/images/MZS4Dq

Inglaterra opôs-se imediatamente ao projeto do mapa cor-de-rosa, pois também pretendia unificar o território desde a Àfrica do Sul ao Egipto, e com o aumento da tensão acabou por estabelecer um ultimato; ou o recuo da pretensão de Portugal, ou a guerra.

A coroa portuguesa cedeu a este ultimato e essa atitude causou grande indignação interna, pois o país sentiu-se humilhado perante a potência britânica.
Nesta época, entre outras manifestações de frustração e revolta contra o governo monárquico, surge “A Portuguesa”, como uma canção de protesto político.

A Portuguesa foi composta em 1890, com música de Alfredo Keil e letra de Henrique Lopes de Mendonça e desde logo foi encarada como símbolo patriótico, pois logo em 31 de Janeiro de 1891, quando falhou no Porto a tentativa de golpe de Estado que pretendia depor a monarquia, já os revoltosos a apontavam como hino para a nação republicana, tal como veio efetivamente a acontecer com a instauração da República a 5 de Outubro de 1910, ocasião em que o povo a cantava eufóricamente pelas ruas.

  • A origem do hino como símbolo das nações

Até ao séc XIX, não existia tradição do uso de hinos no espírito identitário das nações.
O uso de canções destinadas a unir os povos em torno de um ideal comum, centrava-se sobretudo em cânticos e toques num contexto bélico, entoados para motivar a massa humana no propósito de combate, ou como forma de imortalizar e popularizar feitos históricos, através da sua exaltação em cantos.

A prática de fixar composições de letra e música oficialmente ilustrativas da circunscrição e identidade das nações, surge como uma novidade relativamente à ideia de representação dos povos na pessoa do rei.
Assim, também nos últimos 70 anos da monarquia, foi o “Hymno da Carta” (escrito pelo Rei D. Pedro IV para celebrar a outorga da Carta Constitucional em 1826) o Hino oficial da nação.

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Partitura do "Hymno da Carta" (Fonte: > https://goo.gl/images/WujMLK

Ao brotar da revolta contra o ultimato inglês, “A Portuguesa”, no seu tom de marcha independentista e triunfante, torna-se naturalmente um símbolo nacional. Todavia, por ter sido estandarte sonoro dos revolucionários republicanos, foi proibida a sua execução em actos solenes e oficiais pela monarquia, até ressurgir espontaneamente com a deposição do último rei de Portugal.

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D. Manuel II- último rei de Portugal (Fonte: > https://goo.gl/images/5hg6Cc

  • A música

Apesar de ser determinada Hino Nacional pelo Decreto da Assembleia Constituinte em 19 de junho de 1911, “A Portuguesa” foi surgindo com várias versões da melodia e dos instrumentos utilizados na sua execução, o que levou o governo a nomear uma comissão encarregue de estabelecer a sua versão oficial (aprovada por Resolução Conselho de Ministros a 16 de Julho de 1957 e publicada no Diário do Governo, 1ª série, nº 199, de 4-9-1957), que mantém até hoje.

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Partitura oficial d´"A Portuguesa" - Arquivo da Biblioteca Nacional

  • A Letra

O poema original é composto por três partes, mas apenas a primeira parte é entoada atualmente como o Hino Nacional Português, do seguinte teor:

~-~
Heróis do mar, nobre povo,
Nação valente, imortal,
Levantai hoje de novo
O esplendor de Portugal!
Entre as brumas da memória,
Ó Pátria sente-se a voz
Dos teus egrégios avós,
Que há-de guiar-te à vitória!

Às armas, às armas!
Sobre a terra, sobre o mar,
Às armas, às armas!
Pela Pátria lutar!
Contra os canhões
marchar, marchar!

~-~

As outras duas partes, normalmente desconhecidas por não constarem da versão oficial do Hino, são do seguinte teor:

~-~

Desfralda a invicta Bandeira,
À luz viva do teu céu!
Brade a Europa à terra inteira:
Portugal não pereceu
Beija o solo teu jucundo
O Oceano, a rugir d'amor,
E o teu braço vencedor
Deu mundos novos ao Mundo!
Às armas, às armas!
Sobre a terra, sobre o mar,
Às armas, às armas!
Pela Pátria lutar
Contra os canhões marchar, marchar!

Saudai o Sol que desponta
Sobre um ridente porvir;
Seja o eco de uma afronta
O sinal de ressurgir.
Raios dessa aurora forte
São como beijos de mãe,
Que nos guardam, nos sustêm,
Contra as injúrias da sorte.
Às armas, às armas!
Sobre a terra, sobre o mar,
Às armas, às armas!
Pela Pátria lutar
Contra os canhões marchar, marchar!

~-~

  • <>> Curiosidades:

Existem referências (não comprovadas) de que a versão original do poema apelava diretamente à revolta contra os Ingleses, uma vez que à época da revolta do Porto seria cantado sob a forma "contra os bretões" (onde hoje se diz "contra os canhões")…marchar, marchar….

Da versão aprovada oficialmente em 1957 foi depois retirada uma adaptação para grande orquestra sinfónica (da autoria de Frederico de Freitas) e a partir desta uma outra para grande banda marcial (da autoria do major Lourenço Alves Ribeiro).

Por ser um símbolo da revolução republicana foi determinado pelo Ministério da Guerra que, sempre que fosse executado este hino, os militares apresentassem continência (quando fardados) e se conservassem de pé (em qualquer caso) até ao final da execução- o que ainda hoje se mantém.

{Este post foi editado em 27.07.2018 para participar na edição 3 do desafio #fazendohistoria }

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