#FILMOTECA# - "O Caminho das Nuvens" (2003)
Sinopse: Romão é um pai de família que encontra-se desempregado. Decide então juntar a família (esposa + quatro filhos) e viajar, de bicicleta, do interior da Paraíba até a tão sonhada cidade do Rio de Janeiro em busca de um trabalho decente e uma vida digna para eles.
Seja ambicioso ou mais simples... Todo mundo tem um sonho. Mas a busca pelo mesmos às vezes é muito árdua e cheia de obstáculos, fazendo com que milhões de pessoas acabem desistindo de realizá-los. Uma frustração maior acontece quando as coisas se tornam ainda mais complicadas e envolvem muitas pessoas que dependem de você... Em O Caminho das Nuvens, o cinema brasileiro explora com singeleza essa temática tão sensível.
Esse é aquele tipo de road movie (só que guiado por bicicletas, haha!) que prende a atenção do público logo nos primeiros takes em virtude de uma fotografia bem marcante, com traços de cores bem vibrantes e apresentações de paisagens através de ângulos que muitas vezes por serem tão peculiares chamam mais atenção do que a própria história em si.
A peregrinação dessa família, que é extremamente humilde, pelas estradas - muitas vezes íngremes e sem asfalto - em busca de um futuro mais promissor é envolvente, desafiadora e cheia de ótimos momentos, além de ter muita beleza e muito simbolismo como ingredientes principais.
O roteiro sabe explorar com cautela (evitando ao máximo os clichês - embora eles existam - que fazem parte desse gênero cinematográfico) as adversidades que eles enfrentam ao longo do caminho, que lhes reserva muitos momentos tortuosos. No entanto, há um equilíbrio na carga dramática, abrindo espaço para algumas situações engraçadas que criam um contraponto interessante no resultado final.
O caminho longo é cheio de personagens que vão dos mais caricatos aos mais bem construídos. Cada local por onde a família passa, reserva um "conto" diferente e partir daí, são estabelecidas as camadas que vão construindo com clareza a estrutura do filme (algo que ajuda a trazer o telespectador para dentro da história com uma maior velocidade).
De maneira geral o elenco é competente, mas os destaques óbvios vão para as atuações de Wagner Moura e Cláudia Abreu, que além de terem cenas sempre bem estruturadas (tanto sozinhos quanto em separado), conseguem gerar aspectos dramáticos capazes de provocar momentos incisivos de reflexão na mente do público, além de serem o fio condutor para que todos os arcos mais importantes da narrativa aconteçam.
Vicente Amorim dirige o filme com altos e baixos. Apesar de conduzir a narrativa com um olhar bem crítico na maioria das vezes, ele se perde em alguns momentos por não conseguir ajudar a narrativa com o andamento dos acontecimentos. Algumas passagens acontecem rápido demais (anulando o poder que elas naturalmente carregam) e outras, que não tem muito "pano para manga", acabam sendo estendidas ou são quase fora de contexto (algo que em aqui e ali causam uma certa estranheza na trama).
No entanto, o saldo é extremamente positivo porque apesar desses erros o trabalho que Amorim faz tem uma alma muito viva, uma urgência em mostrar aquela jornada da maneira mais humana possível. Equilibrando as coisas entre as lágrimas e os risos, ele consegue imprimir uma identidade única ao projeto, por conseguir fazer com o que o mesmo se sobressaia de uma maneira intimista.
O Caminho das Nuvens é um filme de produção bem risível (algo que pode afastar o público mais "exigente" nesse sentido), mas em nenhum momento isso prejudica a trama porque o tom do filme nunca foi esse. O que importa aqui é a provocação / reflexão que essa jornada familiar é capaz de causar, despertando no público um questionamento acerca dos seus próprios sonhos.