5 Mitos sobre a Europa que você ainda acredita

in #brasil5 years ago (edited)

Ahh! A Europa, berço da civilização, terra de um povo educado e próspero, onde tudo funciona e malandragem não existe.


O paraíso da civilização ocidental

A Europa carrega uma série de idealizações no imaginário popular brasileiro, algumas vezes baseado em anedotas ou simplesmente distorções da realidade.

É comum encontrarmos quem viaja pra Europa por algumas semanas e volta contando maravilhas sobre o velho mundo.
Há também aqueles que já vivem na Europa, e ao chegar ao Brasil exaltam suas qualidades, como o sistema público de saúde é maravilhoso, como as escolas são fantásticas, como as pessoas nem sabem o que é roubo e são todas honestas.
Algumas dessas qualidades já se tornaram lugar comum, clichês que cansamos de ouvir de viajantes falando de suas experiências, e por isso assumimos como verdadeiras.

Mas e se eu te falar que várias dessas qualidades são, no mínimo, distorcidas. Algumas estão realmente longe da realidade olhando por qualquer análise concreta dos fatos, mas continuamos espalhando Brasil afora, mantendo essa idealização do glamour Europeu.

Depois de acompanhar grupos de brasileiros que moram por aqui também percebo um padrão bem comum: Há muitos brasileiros que reclamam muito sobre a Europa enquanto estão aqui, mas que para outros brasileiros morando no Brasil apenas propagam a mesma imagem de "terra ideal", como se a Europa fosse outro planeta se comparado ao Brasil.
Alguns desses clichês, eu diria que podem ter sido verdades num passado não muito distante, mas que hoje cada vez mais fazem parte de uma memória nostálgica.

Listarei os cinco principais itens que considero parte dessa desinformação sobre a Europa, sempre acompanhado de fontes com dados mais concretos do que o seu sobrinho que acabou de voltar de uma visita à Paris.

1. Violência? Europeu não sabe o que é isso.

Esse talvez seja o mais polêmico, porque sim, o Brasil é mais violento que a Europa em geral, crimes violentos são infinitamente mais comuns no Brasil. Porém não é isso que vim falar aqui, e sim de brasileiros que voltam para o Brasil dizendo que na Europa tudo é tão seguro que você pode esquecer seu notebook na rua e voltar depois pra pegar que ninguém rouba… bom, pra essas pessoas tenho péssimas notícias.
Mas se ficasse só por isso tudo bem, mas furtos em geral são extremamente comuns em todas as grandes capitais da Europa.

É comum encontrar placas avisando pra tomar cuidado com "pickpockets", seja no Louvre ou nos trams de Amsterdam.

Bicicleta é outro item que é furtado o tempo todo; Aqui em Amsterdam onde bicicleta é o meio de transporte mais utilizado, é difícil conhecer alguém que nunca teve uma bicicleta furtada.
E o que considero o pior, invasão de propriedade é algo assustadoramente comum, a Holanda, onde moro, é campeã mundial segundo dados da UNODC, modalidade inclusive que o Brasil se sai melhor que a grande maioria dos países europeus.

Aliás furtos em geral, o Brasil se sai melhor, recomendo navegar pelas estatísticas de criminalidade da UNODC pra ter uma noção melhor.

Já sei, você deve estar pensando "Ahh, isso é manipulado, impossível o Brasil ser melhor".
Porém baseado na minha experiência eu diria que são números bem plausíveis. Em 30 anos morando no Brasil eu posso contar nos dedos de uma mão a quantidade de pessoas que tiveram casa invadida… em 5 anos de Europa eu já perdi a conta.


Top 10 países que mais tiveram invasões à residência em 2013


Top 10 em furtos

Isso sem mencionar a escalada de violência crescente que tem acontecido em particular em Londres, onde assaltos à motoboys se tornou lugar comum e violência com facas e ataques com ácidos tem crescido assustadoramente.

Muitos também associam os self checkouts (caixas de auto atendimento no mercado) como um sinal de honestidade… desculpa quebrar novamente o mito, mas não.
Esses caixas são usados por uma razão simples, a mão de obra é cara, e mesmo com furtos ainda vale a pena automatizar esse processo do que pagar alguém.

E o tempo todo novas tecnologias pra evitar furto são adicionadas pra que esse risco seja minimizado ao máximo.
Há diversas medidas de controle, como pesagem do produto, scan de nota fiscal, checagem aleatória de consumidores, câmeras e agora inteligência artificial que tornam cada vez menores o número de furtos que ocorrem, e não, não é simplesmente se baseando na honestidade das pessoas.

2. Ninguém ostenta

Outro mito que vejo sendo muito difundido é o de que não existe ostentação e as pessoas não compram luxo.
Isso entra no que classifico como brasileiros que se mudam pra Europa, mas continuam vivendo numa bolha do que acreditam ser a Europa imaginária.

Marcas de luxo são absurdamente mais comuns por aqui, marcas de entrada como Michael Kors você vê com uma frequencia alta nas ruas, inclusive no transporte público.

Esse texto da revista Epoca, apesar de ser de 2010, apresenta algumas informações interessantes, apesar do mercado brasileiro ter crescido recentemente ainda está longe de se equiparar à Europa e EUA, e isso foi antes da recessão.

" Embora o Brasil já tenha conseguido espaço para entrar nesse clube, ainda não está no mesmo patamar de Europa e Estados Unidos. A porta de entrada para o mundo das grifes no país são os acessórios, principalmente em bolsas e óculos. "A maioria dos brasileiros pode não comprar uma bolsa de R$ 15 mil, mas vai levar um chaveiro de R$ 1,2 mil", afirma Rocha. "

Ou seja, o grande acesso ao Brasil ao mercado de luxo eram os chaveirinhos.
Basta notar a quantidade de lojas voltadas ao mercado de luxo nas grandes (ou nem tão grandes) cidades europeias e nas capitais do Brasil.
Há cerca de 5 anos que Curitiba ganhou seu primeiro shopping de luxo, muitas capitais brasileiras ainda nem possuem isso.


Não, não tem C&A aí dentro

Aqui na Holanda, que é um minusculo país de 17 milhões de pessoas (menor que a grande São Paulo), existem 7 Bijenkorf (shopping ou loja de departamento de luxo) espalhados pelo país, e ao menos Amsterdam possui uma rua só voltada à marcas de luxo.

A principal diferença que vejo, é que muita coisa que é considerada luxo e ostentação no Brasil, por aqui são itens normais.
Em especial marcas de luxo de entrada, aqui são vistas com mais naturalidade, e ninguém vai achar que você está ostentando por ter uma camiseta da Tommy Hilfiger ou atender um Iphone na rua.

3. Classe média vive com mais luxos no Brasil

Primeiro é preciso definir o que é classe média.
Pegando a definição oficial do Brasil o nivelamento se torna muito baixo, então vamos considerar algo mais abrangente.
Essa questão é um pouco mais complexa, geralmente serviços que demandam muita mão de obra são mais caros em países desenvolvidos, no entanto, em muitos casos acaba se compensando por gadgets mais acessíveis que ajudam a desempenhar essa atividade, exigindo menos horas de trabalho.

Quando se considera a diferença da média salarial dos países a diferença real passa a ser mínima.
Um exemplo comum é o trabalho doméstico.

Cerca de 5 anos atrás eu pagava no Rio de Janeiro 100 reais de diária, sem incluir passar roupa. Aqui na Europa o valor geralmente é cobrado por hora e não por dia, variando entre 10–15 euros por hora, gastam em média 2–4 horas pra limpar uma casa.
Mas não é pouco tempo? Não, é um tempo suficiente pra uma limpeza de rotina, que é o que eu também tinha no Brasil. Isso é ajudado por itens de limpeza que aqui são mais acessíveis como aspiradores ultra-potentes (Dyson) ou mesmo aspiradores robôs (Irobot Roomba), limpadores a vapor, máquinas de lavar louça, entre outros itens.
A diferença do impacto no orçamento acaba sendo irrisória.

Muita gente ainda tem uma imagem de um Brasil de 25 anos atrás, onde era comum se ter empregada doméstica dormindo em casa, o que já não é mais a realidade da imensa maioria da população. Em 2012–2013 apenas 4% das famílias possuiam empregada doméstica, atualmente esse número deve ser ainda menor.

4. Tudo é público gratuito e de qualidade

Esse é um erro comum, e em geral o brasileiro tem uma visão idealizada de como os serviços públicos da Europa funcionam, do transporte público ao sistema de saúde.

Uma coisa já é bom deixar claro, o SUS é um sistema de saúde mais acessível do que praticamente todos os sistemas de saúde da Europa, talvez o que mais se aproxime é o NHS do Reino Unido, mas que não permite acesso direto à especialistas, é necessário passar por um médico generalista primeiro, além dele sofrer com uma crise financeira.
Mesmo países escandinavos não possuem sistemas de saúde totalmente gratuitos, na Noruega, por exemplo, após os 16 anos, é necessário pagar a sua franquia antes de se tornar elegível para a isenção.

"However, while medical treatment is free of charge for any person younger than the age of sixteen, residents who have reached adulthood must pay a deductible each year before becoming eligible for an exemption card. The card entitles one to free healthcare for the remainder of that year."

Na Holanda e Suíça não existe sistema de saúde público, não há um SUS nem nada parecido. Existem seguros de saúde privado (obrigatórios), e vouchers para os mais pobres, em um modelo de saúde conhecido como modelo Bismarck.

E mesmo pagando o seu seguro saúde, você ainda precisa pagar uma franquia anual (que nesse ano varia de 385 até 885 euros), e apenas o excedente desse valor que passa a ser coberto pelo seguro.

A crítica mais comum que ouço sobre o sistema de saúde daqui é que os médicos evitam ao máximo te passar exames e remédios, muitos brasileiros trazem remédios do Brasil, e a piada geral aqui é que os médicos holandeses acham que tudo se cura com Paracetamol e um descanso.

Também esqueça poder chegar na emergência quando quiser, com exceção de acidentes e casos realmente graves você não vai ser atendido na emergência, até pra isso é necessário passar primeiro pelo seu médico generalista.
Assim como no sistema de saúde, creche e universidades também não são gratuitas em diversos países, incluindo aqui na Holanda.

Para piorar essa mentalidade de "universidade para todos" não existe. Alguns países como Holanda e Alemanha, já decidem se você pode fazer universidade ou não quando você ainda está entrando no ensino médio, e apesar de ter formas de alterar essa decisão, não é um caminho simples.

5. Malandragem não existe

Você já teve ter ouvido referências de como só no Brasil existe a tal malandragem, a tentativa de tirar vantagem em tudo, a tal lei de Gerson.
Porém, em outras partes do mundo a malandragem não é algo tão raro assim.
Eu costumo dizer que qualquer lugar que tenha leis estúpidas e fáceis de burlar, as pessoas o farão. O Brasil só calha de ter muitas dessas.

Aqui, por exemplo, ao vender uma casa e for negociar algum móvel dentro da casa pra ser vendido junto você precisa pagar um imposto sobre essa transferência… isso se você registra-la, para não ter que pagar, o que a grande maioria das pessoas faz, e os cartórios fingem que não veem, é fazer a transferência por fora, sem precisar pagar nada de imposto.
Também existem os casos mais danosos de malandragem, anúncios falsos de aluguel de quarto estão entre os mais comuns, onde o anunciante pede um depósito inicial pra segurar o imóvel… que não existe.
Outro golpe que acontece bastante também são as falsas multas pra imigrantes

Nos grupos de Brasileiros na Holanda no Facebook era comum ver um tópico dizendo "Não existe malandragem aqui, ninguém tenta tirar vantagem" e outro tópico logo depois "Sofri um scam tentando alugar um quarto, me ajudem!".

Conclusão

É impressionante como alguns desses mitos persistem mesmo após décadas de ou mudança de comportamento ou simples falsa propagação por brasileiros.
É preciso entender que muitos desses mitos não passam disso, mitos, que são propagados seja por ignorância, seja por conveniência, e acabam iludindo muitas pessoas que esperam encontrar um paraíso na Terra, não por acaso a síndrome de Paris é algo tão comum.

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Boa, @danielcfranca! O estereótipo é bem comum mas, na verdade, dentro da mesma cidade temos realidades muito diferentes, seja no Brasil, Europa, Estados Unidos e, provavelmente, qualquer grande cidade do mundo. Eu moro em uma cidade no Brasil onde violência ou roubos são quase inexistentes, mas se viajar 70 km até a capital dificilmente encontrará alguém que não tenha uma história para contar. Dentro da mesma cidade, estado ou país, varia muito. Um amigo nosso, que nunca havia tido a bicicleta roubada no Brasil, foi roubado em Londres. Então, realmente, não dá para generalizar, obrigado por compartilhar ;)

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