#FILMOTECA# - "Através da Sombra" (2016)

Sinopse: Um homem rico contrata a professora Laura para educar seus dois sobrinhos órfãos (a cativante Elisa e impetuoso Antônio), herdeiros de uma fazenda de café. Mas, aos poucos, Laura testemunha estranhos acontecimentos, que só se intensificam e começam a desafiar a sua sanidade mental.

O cinema brasileiro relacionado ao suspense/horror ainda anda a passos pequenos (apesar de ter condições de acelerar o passo se quisesse). Um ou outro exemplar consegue despontar nesses gêneros e consegue dar o fôlego necessário para que outras produções do mesmo segmento continuem a serem desenvolvidas e produzidas... No entanto, ainda não conseguiram canalizar de uma forma muito eficiente toda a energia que esses gêneros cinematográficos têm na sua essência e Através da Sombra é mais uma prova disso.

O livro "A Volta do Parafuso" (de Henry James) foi o material escolhido por Walter Lima Jr. para tentar colocar o Brasil na rota dos filmes de suspense/horror psicológico. Ele assina o roteiro e a direção do longa, que chega com uma promessa de apresentar algo diferente do que pode ser conferido no livro (principalmente no que diz respeito à sua estrutura de seus argumentos)... Mas falha de uma forma notável no que deveria ser o seu ponto forte: a maneira como o suspense é construído.

Tudo é muito claro demais na apresentação do roteiro e isso elimina por completo a possibilidade de criar alguma tensão psicológica ou um enredo mais desafiador, algo que propicie uma profundidade narrativa que coloque o público para pensar sobre o que está assistindo.

Seja referente aos segredos que a vasta propriedade esconde ou no desenvolvimento de seus personagens, as informações que são jogadas para o espectador entregam o segredo da trama sem fazer muito esforço (e isso torna a produção - nesse aspecto - em algo bem desleixado, incluindo não apenas o roteiro, mas também o fraco e inexpressivo trabalho do diretor).

O clima no qual à trama se estabelece (época do período da escravatura no Brasil) perde praticamente todo o seu potencial ao não conseguir explorar fisicamente todos os espaços da propriedade de uma forma mais objetiva, optando por uma subjetividade que aos olhos dos mais atentos não surte nenhum tipo de efeito (apenas uma sensação de perda de tempo por estar assistindo algo óbvio demais).

A direção de arte do longa pesou à mão afim de deixar tudo muito perfeito (cenários limpos demais, roupas sempre bem passadas, tudo brilhando) e não colabora para criar uma atmosfera que apresente o mínimo de frio na espinha.

Nesse mesmo gancho sofre a fotografia (que apesar de criar alguns bons momentos com cenas bonitas - a queima do café, por exemplo, rendem alguns takes bem contemplativos - deixa tudo muito nítido. São aspectos técnicos que foram bem pensados, mas mal executados... E a falta de elementos perturbadores (e os poucos que existem são dissolvidos à nada por causa do excesso na produção visual) anula qualquer ambiguidade que a história poderia apresentar.

Os personagens tem as suas complexidades, mas as formas como eles são tratados é muito rasa (a única que apresenta uma camada mais complicada de ser descascada é Laura, a professora interpretada pela atriz Virgínia Cavendish, mas que mesmo assim não tem uma evolução satisfatória) e isso mina o interesse do público em criar alguma empatia maior por eles.

A tentativa de inserir novos argumentos para a evolução da história esbarrou em um aspecto que poderia ter funcionado muito bem (a tensão sexual), mas por ter sido jogado dentro da narrativa de forma quase aleatória resultou em uma abordagem é fria e um tanto quanto constrangedora (por envolver uma criança) e não gera nenhum efeito positivo, tornando-se então, em um argumento falho.

Uma sucessão de erros toma conta do processo de construção da história desde o seu início vazio até os seus momentos finais (e a insistência da tensão sexual no terceiro ato se mostra um erro bem pontual para tentar explicar o clímax), que por sinal... Termina "do nada" e permanece em aberto, deixando a ideia (apenas a ideia) de que uma produção no estilo cult foi o que acabou de ser assistido na tela.

Incapaz de apresentar uma única boa cena de suspense durante toda à sua projeção (o que eu particularmente acho algo preocupante porque à base da história tinha ótimos elementos para isso... mas acaba jogando todas as suas oportunidades pelo ralo), Através da Sombra é um filme que apesar de se esforçar para ser notado, não consegue sair da escuridão que ele mesmo causou durante toda a sua trajetória.